Precisamos debater mais para termos uma regulação eficiente e equilibrada
Nos últimos dias, ocorreram diversas manifestações públicas a favor de acelerar a aprovação de uma proposta de regulação de plataformas digitais. O objetivo seria dar solução a problemas complexos, como a desinformação, ou trágicos, como os abomináveis ataques recentes em escolas brasileiras. Reforçamos nosso repúdio aos últimos episódios de violência e reafirmamos nossa solidariedade a todas as pessoas que foram, de algum modo, afetadas.
Apesar do anseio por soluções imediatas, propostas de regulação da internet discutidas sem o devido cuidado podem, em lugar de resolver essas graves questões, acabar prejudicando o trabalho que já é feito, promovendo impactos negativos na vida das pessoas. Uma legislação apressada pode piorar o funcionamento da internet, cercear direitos fundamentais, favorecer determinados grupos ou setores da economia e criar mecanismos que coloquem em risco discursos legítimos e a liberdade de expressão.
Infelizmente, esse debate público não vem acontecendo da mesma maneira como foi com o Marco Civil da Internet, uma lei brasileira que se tornou uma referência global por sua elaboração colaborativa e princípios modernos.
A principal proposta em discussão hoje é o Projeto de Lei 2630. Depois de passar por uma votação no Senado em 2020, o projeto tramitou na Câmara, onde sofreu diversas alterações que distanciaram o texto de seu objetivo original de ajudar a combater a desinformação. Isso sem o texto passar por nenhuma comissão.
No ano passado, nós apontamos como determinados mecanismos do PL trariam risco para a segurança dos usuários, afetariam a capacidade de pequenos e médios negócios de promover seus produtos e serviços ou, ainda, de os brasileiros buscarem e acessarem informação de qualidade.
É certo que um projeto de tamanha complexidade merece mais espaço de discussão e mais tempo para um debate de qualidade. Esse parece ter sido também o entendimento na Câmara, quando, em abril do ano passado, rejeitou em votação um pedido de trâmite em regime de urgência para o PL 2630.
Nesta semana, circulou uma nova versão do texto que incorpora contribuições do Governo Federal ao relatório do PL 2630. Uma parte relevante dos pontos incorporados nunca foi objeto de debate no Congresso. Além disso, existe a possibilidade de o projeto ser colocado para votação em regime de urgência até a próxima semana, o que limita o espaço de discussão e as possibilidades de aperfeiçoamento do texto no Congresso.
Entendemos e concordamos com a urgência em lidar com desafios que preocupam a todos, como desinformação, ataques violentos a escolas ou à democracia – trabalhamos todos os dias para contribuir com o enfrentamento dessas questões. Mas precisamos ser cuidadosos.
O texto atual propõe mudanças significativas na forma como a internet funciona hoje e inclui propostas novas que podem, contrariamente, agravar o problema da desinformação. Somente trabalhando juntos, de maneira coordenada poderemos chegar a uma proposta de legislação mais eficiente e equilibrada.
Estamos atravessando tempos desafiadores e temos a responsabilidade compartilhada de construir alternativas que garantam a segurança e o bem-estar dos brasileiros, sem trazer consequências indesejadas para o uso da Internet no Brasil e sem comprometer a inovação e a geração de oportunidades propiciadas pelas novas tecnologias.
Acreditamos que os brasileiros, aqueles que usam as nossas plataformas ou não, precisam estar cientes da discussão em torno do PL 2630. Seguiremos empenhados em contribuir para o debate. Ao mesmo tempo, continuaremos contrários a uma discussão apressada, em regime de urgência, de propostas de lei que possam impactar a segurança e o acesso de milhões de brasileiros a produtos úteis, como a Busca do Google e o YouTube. Todos os brasileiros precisam fazer parte dessa conversa.