Criadora do programa Ela Pode e parceira do Google, Ana Fontes lista os principais desafios das brasileiras que querem empreender
A empreendedora social Ana Fontes trabalhou por quase 17 anos no mundo corporativo. Durante o período, chegou a participar de um seleto programa de treinamento para mulheres da Fundação Getúlio Vargas, sendo uma das 35 selecionadas entre 1000 mulheres inscritas. O processo seletivo restrito incomodou Ana, que acabou abrindo um blog para compartilhar o conhecimento que aprendia no curso, em 2010.
Aquela foi a semente do que hoje conhecemos como Rede Mulher Empreendedora, organização focada em treinar e empoderar mulheres pelo Brasil. Em 2017, Ana fundou o IRME – Instituto Rede Mulher Empreendedora –, com o objetivo de expandir as capacitações para mulheres em situação de vulnerabilidade social.
Um dos programas mais famosos do Instituto é o Ela Pode, que já treinou gratuitamente cerca de 250 mil mulheres em mais de 1000 municípios brasileiros. Com o novo anúncio de 2023, a próxima fase de capacitações permitirá que mais 100 mil brasileiras sejam treinadas para avançar na carreira ou empreender no próprio negócio. Conheça mais sobre o apoio do Google.org, instituição filantrópica do Google, ao programa Ela Pode aqui.
Na entrevista a seguir, Ana lista os desafios que já enfrentou em sua trajetória profissional que refletem nos treinamentos do Ela Pode, dá dicas importantes para avançar no mercado de trabalho e "aconselha" a Ana Fontes do começo da carreira. Confira:
Em sua opinião, quais são os principais desafios enfrentados pelas mulheres que querem empreender no Brasil?
Ana Fontes: Entre os desafios, o primeiro é acesso a capital, as mulheres têm menos acesso a recursos financeiros do que os homens. Capital no sentido mais amplo, ou seja, crédito, microcrédito, o fundo de investimento, anjo, o investidor e todas as modalidades de acesso a recurso financeiro. Esse é um dos desafios. O segundo desafio é definir claramente o tipo de negócio. Muitas vezes, as mulheres acabam criando negócios dentro da área de domínio delas, mas não necessariamente um negócio que vai atender às necessidades de um grande grupo de pessoas e com a chance melhor desse negócio dar certo e crescer. Esse é o segundo. E tem um terceiro item que é: faltam redes de apoio para as mulheres, não redes como a Rede Mulher Empreendedora, mas creches e serviços públicos que ajudem essas mulheres, principalmente aquelas que são mães, a ter uma condição melhor de tocar o negócio simultaneamente, ter tranquilidade para tocar o restante da vida. E o último ponto que eu colocaria também é o acesso a ambientes de inovação, ou seja, essas mulheres têm menos acesso a programas de aceleração e ambiente de inovação para acelerarem os negócios delas. Então isso também é um dos desafios enfrentados.
Quais são as principais habilidades que a mulher empreendedora deve desenvolver para conquistar um espaço no país?
Ana Fontes: Eu acho que o primeiro é buscar muito conhecimento, porque empreender não é como era antigamente, que as pessoas metiam as caras sem ter conhecimento nem nada. Em segundo lugar, é superimportante construir uma rede de relacionamento muito forte, ou seja, se conectar com pessoas de forma disciplinada e consistente. Um terceiro ponto é buscar um mentor. Um mentor é alguém que já passou pelo processo ou que já empreendeu há mais tempo, que pode ajudar principalmente naqueles momentos em que você tem mais dúvida. Um quarto ponto é desenvolver essa capacidade de ter um olhar multidisciplinar, porque a pessoa empreendedora não pode ter a capacidade técnica de uma área só. Tem que ter um olhar mais multidisciplinar. Então, essa é mais uma característica muito importante. O quinto ponto é cuidar muito bem da saúde mental, empreender é cheio de altos e baixos, especialmente para nós, mulheres. Então, desenvolver autoconhecimento é absolutamente fundamental. O último ponto, não menos importante, é, além de construir redes de relacionamento forte, você trabalhar as habilidades para apresentar o seu negócio, é o que a gente chama de pitch, pode chamar de negociação, ou seja, você trabalhar o seu conhecimento e a sua base sobre o seu negócio para que você consiga falar dele com mais tranquilidade.
Você viveu desafios parecidos com os das mulheres que você treina ao longo da sua trajetória com a Rede?
Ana Fontes: Com certeza, todos os desafios que eu treino hoje nas mulheres da Rede são desafios que eu já passei. É muito importante falar sobre os erros. Não é porque a gente errou, que a gente não tem capacidade de mudar e fazer as coisas de uma forma diferente. Isso tudo que eu ensino para as mulheres hoje é muito a base da minha jornada como empreendedora, seja o cuidado com as finanças, buscar conhecimento o tempo inteiro, buscar essa rede de relacionamento e atuar muito fortemente em parceria com outras mulheres.
Com a experiência que você tem hoje, qual seria o melhor conselho que você poderia dar para a sua antiga versão, a Ana do começo da jornada no mercado de trabalho?
Ana Fontes: Com a experiência que eu tenho, eu diria para ter muita paciência, porque quando a gente está começando, a gente é muito afobado. A gente quer fazer tudo de uma vez, então eu acho que o conselho mais importante é "tenha paciência". Se alie a pessoas que estão com você, que estão torcendo por você, que querem o seu bem, que vão te ajudar, que vão dar uma palavra motivadora, vão te abrir uma porta. E um outro conselho que eu daria que realmente faz a diferença é trabalhar sua autoconfiança. Pode parecer autoajuda, mas trabalhar sua autoconfiança é fundamental, porque naqueles momentos em que você tem vontade de desistir, saber quais são as suas forças e fraquezas – e o que você tem que trabalhar (em si mesma) – é fundamental para que o seu negócio dê certo.